terça-feira, maio 08, 2007

Pois é sr. Gaiman...


No último fim-de-semana concluí a leitura do calhamaço de A Estação das Brumas.

Foi um tanto quanto broxante...me bateu aquela sensação de “ok, isso é um clássico dos quadrinhos? Porquê?”.

Sempre fui um leitor esporádico de Sandman, catando um exemplar aqui, outro ali, geralmente gostava do trabalho do Gaiman, embora desconfiasse que no fim das contas, após tanto blá-blá-blá, Sandman não passava de um gibi tão profundo quanto um pires.

Tive que ler dois encadernados para me certificar que é mesmo. Já apanhei vento por aí mais consistente que aquilo.

Neil Gaiman é cheio de boas idéias, mas peca feio no desenvolvimento delas, arrastando as sagas pra lá e pra cá e no fim das contas não chegando a lugar nenhum.

Todas as idéias boas e sacadas acabam ficando perdidas pelo meio do caminho, sem um desenvolvimento ou conclusão mais trabalhada. Talvez um exemplo bem claro disto seja o destino da Chave do Inferno em Estação das Brumas... simplesmente QUALQUER decisão que o autor tomasse, seria mais interessante –porém trabalhosa enquanto escritor- do que a que a história assume, Neil Gaiman joga a idéia de que tudo pode acontecer e quando é hora de chegar às vias de fato, dá uma saída pela direita no melhor espírito Leão da Montanha, finge que não é com ele e escolhe um final pra lá de preguiçoso e cômodo.
Mais broxante que levar a Natalie Portman pro motel e descobrir que ela é homem.
Escrever é correr riscos. As grandes histórias nascem daí.

Nem o fato de Sandman ser um redondo zero no quesito profundidade me incomoda.
Uma história pode ter por proposta apenas diversão e ser uma autêntica obra-prima em termos de arte, tá aí o Pato Donald do Carl Barks, Asterix, o Gaulês, Tintin, Lucky Luke, toda a obra do Jack Kirby, Blueberry nos bons tempos do Charlier, etc, etc, etc, que não me deixa mentir.

O que me incomoda é a autêntica obsessão de Neil Gaiman em querer a todo custo nos mostrar a cada página como ele é culto-profundo-inteligente-erudito-etc-coisa-e-tal, então dá-lhe citação a poetas obscuros ingleses do século XVIII em cada página (mesmo que isso não acrescente NADA ao diálogo ou à história em si) , dá-lhe referências obscuras de ocultismo e cultura pop do século XX, dá-lhe ápices da profundidade PauloCoelhanas como “um lugar que não é um lugar, em um espaço que não é o espaço” jogados pelas páginas.

No meio disto tudo ele acaba esquecendo que o que realmente importa é contar uma boa história... erudição vazia é mero exibicionismo e não serve para nada.

Alguém já parou para refletir no que que realmente muda sua vida ou sua visão de mundo descobrir que Odin é também chamado de Wotan, ou coisa que o valha?

Saudades recente de gente como Alan Moore, Ray Bradbury, Paul Chadwick e Bill Watterson... podem não ser tão moderninhos e não ter tantos fãs, mas sabem divertir, surpreender e fazer pensar e repensar a nossa própria vida como ninguém.

Sem precisar de um caminhão de referências para isto.


Fábio Ochôa

8 Comments:

Blogger Fabio Oliveira said...

Palmas pro Sr. Ochôa.
Sempre achei "A Estação das Brumas" um classico do Sandman, talvez por ter sido a primeira revista do branquelo que eu li. Mas a unica coisa que tinha me impressionado nessa revista, foi o fato do carinha que mandava no inferno ter pedido demissão.
Só tenho que discordar quanto as referencias... Nas historias do Sandaman, em particular, elas servem pra ambientar o leitor que não tem saco pra acompanhar a eterna-depressão-causada-por-uma-enorme-responsabilidade-de-carregar-um-poder-que-ninguem-sabe-qual-é-ou-pra-que-serve que vive o branquelo, e isso as vezes é tomado por "profundidade".
Moral da historia, as historias do Sandman são legais mas se você quiser ler alguma coisa com "contiúdo", va ler Hellblazer.
E tenho dito.

9:52 AM  
Blogger Faber said...

Tá "revoltado", Fábio? Porque agora virou "moda" se "revoltar" contra o Gaiman, o Garth Ennis, o Miller, o Moore...Quáquáquá!!!

10:20 PM  
Blogger Fábio Ochôa said...

Vai ver que virou moda devido às maravilhosas histórias que eles têm apresentado nos últimos anos...

5:57 PM  
Blogger Henrique JB said...

Engraçado. Por coincidência, nesse fim de semana ouvi do Zago uma crítica semelhante à sua. Ele também não leu Sandman na época em que saía por aqui esporadicamente, obrigando os leitores a sofrer meses de abstinência.

Quando ele questionou Sandman na mesa de bar, aquilo me incomodou um pouco. Sempre lembrei dessa revista como um marco, sou da época que revelou Gaiman, Moore, Miller... Mas não me recordo tão bem das tramas para poder discutir o assunto com alguém com igualdade. Lá se vão muitos anos. E agora, vendo que você também tem ressalvas sobre o Mestre dos Sonhos, vi que fiz bem em me abster do debate.

Talvez, não sei, Sandman tenha sido reflexo de seu tempo. Talvez hoje em dia tenhamos outros bons autores, cujos trabalhos são beneficiados pelos caminhos que Sandman abriu vinte anos atrás. Talvez a própria dificuldade de ler aquele material (numa época sem internet, sem facilidade de importar revistas) nos tenha feito valorizá-lo demais. Ou talvez Sandman seja foda mesmo e o Ochôa e o Zago estejam enganados. Mas eu precisaria reler minha coleção para ter certeza.

9:26 PM  
Blogger Saoki said...

Cara, pra entender pra onde vão as histórias "perdidas" em Sandman tem que ler as 75 edições. Ou é certo reclamar do fim de uma história sem ter lido ele?

Quanto as citações e o tal eruditismo que tu falas, bom, não é forçado. Leia o blog do Neil Gaiman. O cara é um poço de cultura obscura, e *tudo* que ele escreve acaba sendo envolvido nisso.

Assim como o Alan Moore, claro. Assim como o Grant Morisson, claro. Assim como o Warren Ellis, claro.
(Pra citar três.)

Mas voltando ao assunto em questão, eu realmente não gostei da Estação de Brumas, e nunca entendi por que *brasielrios* acham essa saga tão boa (*brasileiros*, afinal os gringos preferem outras sagas do Sandman). Deve ser por que foi nessa saga que Sandman ficou famoso no Brasil, na primeira vez que foi publicado, por que todo metaleirinho da época achou lindo o fato do cara colocar Lúcifer em um HQ publicada pela DC.

Eu prefiro Fábulas e Reflexões (cheio de one-shots) ou Vidas Breves (que me fez chorar bastante, e tem uma grande dose da Delírio).

2:01 PM  
Blogger Fábio Ochôa said...

Tá, vamos lá:

Eu li todas as edições, depois de ter escrito o post, é verdade, mas li.
Minha opinião não mudou muito, não é birra, sorry.
Gaiman tem boas idéias? Tem, sem sombra de dúvidas.
Desenvolve boas histórias curtas? Desenvolve.
Se perde em sagas longas? Totalmente.
Tem momentos chatos? Tem.

Citações: quando não tem um propósito específico na história, quando você pode retirar elas da história e a história não perde nada em caracterização ou dramaticidade, sim, então é forçado.
Gaiman faz isso, Morrison também, Ellis também.
Gosto deles, mas eles fazem.

Fumaça e Espelhos do Gaiman é espetacular.
E são todos contos curtos.

6:14 PM  
Blogger Ana Recalde said...

Porra Ochoa... venho visitar seu blog numa boa e vc me dá uma dessa... hehehehehe :P
Olha, eu sou fã incondicional do Neil Gaiman e preciso fazer aqui o meu comentário, até mesmo para que vc "entenda" meu ponto de vista...
Sandman, pra começar, é um clássico dos quadrinhos, por que trouxe uma série de elementos que antes não existiam, como todo clássico. Cavaleiro da Trevas é assim, e é fenomenal de se ler até hoje, como X-men do Stan Lee (ou as primeiras histórias do Homem-Aranha) e hoje são um saco de ler... mas não deixam de ser clássico, deixam?! Se você realmente não entende pq Sandman é um clássico, procure um pouco personagens como os que o Gaiman apresentou em outras publicações anteriores... E veja hoje todos os títulos que ele gerou ou possibilitou existirem (Livros da Magia, Lúcifer, Contos de Faerun e assim por diante)
Agora, quanto a profundidadede Sandman, não está nem de longe nas citações obscuras do Gaiman, mas na forma como ele constroi esse mundo particular onde deidades esquecidas, com medo das extinção buscam ajuda desesperada, ameaçam umas as outras, fazem jogos para sobreviver... mundo particular onde seres perpétuos se tornam seres conscientes de seus erros, cansados de "viver", sim Sandman de maneira geral é uma história que cria o ambiente pra vc entender como um ser, que existe, sempre existiu e sempre existirá se cansa da sua própria vida, uma imensidão de erros de acertos, como a vida de qualquer ser... uma das frases que eu mais gosto de todos os Sandmans é quando um homem imortal morre ele pergunta a morte se ele viveu uma vida longa e ela responde "Todo tamanho que deveria, nem mais nem menos"...
Morpheus foi a voz de uma geração cansada de ver as coisas do mesmo jeito, geração característica do fim de um milênio, ele falou o que muita gente queria dizer e é uma fábula sobre mudança, em todos os sentidos, pessoal, familiar, profissional...
Tirando o mundo vasto que o gaiman criou como pano de fundo, não vou chover no molhado e dizer que as pequenas histórias são as melhores, como "sonho dos mil gatos" e "sonho de uma noite de verão", mas nenhuma desses contos poderiam ser escritos sem criar esse universo peculiar, onde Shakespeare troca seu talento por uma peça, onde 1000 gatos juntos podem sonhar e mudar o mundo... questionar a realidade dos sonhos não é profundo?!
Sem falar na família e nos questionamentos que vimos entre nossos desejos, sonhos, delírios... onde o deleite e o delírio são apenas duas faces da mesma moeda... eu poderia continuar pr muitas horas escrevendo sobre a riqueza de conteúdo que podemos encontrar em Sandman, em todas as metáforas escondidas em cada personagem, só isso já demonstra que essa não é uma obra para ser tratada levianamente, que merece todo nosso respeito e que pode ser profunda sim, basta observar as entrelinhas...
Quanto a narrativa, gosto cada um tem o seu, tem gente que ama Tolkien, mas cá entre nós é um saco de ler... isso faz Senhor do Anéis menos impotante?! Eu amo de paixão a narrativa do Gaiman, então não posso falar muito, não vejo qual é o problema dele citar outros nomes para deuses antigos, ou vc acha mesmo que um deus se contentaria com apenas um nome?!
O univeros de Sandman é riquissimo e vasto, cheio de metáfora perdidas e personagens inesquecíveis... onde vc quer ver mais profundidade, Fábio?!

12:14 PM  
Blogger Marco said...

Concordo com tudo que o Fábio falou.
Menos quando disse que Wotan é Odim. Pelas novas pesquisas historiográficas, ambos são irmãos, assim como Vili e Ve.

8:29 PM  

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