quarta-feira, junho 21, 2006

Fazer o que?

Eu gosto de pessoas. Não adianta, este é o fato.
Eu gosto de pessoas falhas, o mundo já está cheio demais de pessoas perfeitas.
Eu gosto de pessoas ingênuas, às vezes queria ser um pouco mais como elas.
Eu gosto de pessoas épicas e exageradas, onde cada momento é uma megaprodução de três horas.
Eu gosto de pessoas atrapalhadas. Gosto muito de estar na companhia delas.
Eu gosto de pessoas que criam.
Eu gosto de pessoas que cometem gafes.
Eu gosto de pessoas que falam demais, além do que a discrição exige.
Eu gosto de pessoas que tocam campainha da casa dos amigos e saem correndo. Cinco vezes.
Eu gosto de pessoas inteligentes e maduras o suficiente para não se levarem a sério.
Eu gosto de pessoas que sempre tem algum comentário engraçado, independente da situação.
Eu gosto de pessoas que tem e-mails como xena.princesa.guerreira@bol.com.br
Eu gosto de pessoas que não se lamentam quando caem, simplesmente levantam e seguem andando de novo.
Eu gosto de pessoas que ligam para avisar que vai passar "Comando para Matar" na madrugada.
Eu gosto de pessoas que riem por quadras de um acontecimento qualquer.
Eu gosto de pessoas que não tentam lhe convencer serem alguma coisa.
Eu gosto de pessoas que preferem ficar caladas a dizer uma frase feita ou algo sem emoção.
Eu gosto de pessoas emotivas.
Eu gosto de pessoas simples.

Fábio Ochôa

O Rei Glutão


Aqui temos outro esboço de personagem para a série Van Helsing, uma das aberrações da primeira história: o Rei Glutão.

Um bebê inchado e gigantesco, com dentes formados por pontas de facas, olhos de boneca e uma carne flácida e escorrida, leitosa, que aprisiona uma vila, alimentando-se exclusivamente de bebês.

Um tanto chocante e bizarro, recupera aquela tradição de horror inesperado e grotesco do século retrasado.

O último século prestou um autêntico desserviço para quem tenta escrever histórias assustadoras, com sua progressiva banalização do fantástico e do desconhecido, acabou fazendo com que histórias de vampiros, lobisomens, serial killers e congêneres afins se tornassem quase um exercício de lógica matemática, "hmmmmm aí está o vampiro, o sol pode matá-lo, alho e cruzes o afetam", tornando estas figuras tão demasiadamente familiares à nós, que todo o medo do desconhecido que eles carregavam, gradualmente foi se evaporando ao longo do século.

Mas tente imaginar o que as pessoas sentiram ao ler O Médico e o Monstro, ou Drácula, há mais de um século.
Tente imaginar como estes conceitos eram obscuros, excitantes, desconhecidos naquela época.
É em parte este clima que tentamos resgatar na saga de Van Helsing.

Ao menos nos pareceu uma boa maneira de honrar a tradição que aqueles livros nos deixaram.

Fábio Ochôa

NOVO!!! Curso de Vilania Intensiva E-9!!!

Nós do Estúdio 9 como sempre, prontos para novas propostas de trabalho, estamos aqui lançando uma nova cartada decisiva:
Você que está aí do outro lado do computador, que sempre quis ser um vilão e dominar o mundo, aterrorizar a sociedade livre, transformar o Vaticano em quadra de futebol ou coisa que o valha, mas nunca soube nem por onde começar, pois bem, caro amigo facistinha, seus problemas acabaram!
Chegou o novo curso de vilania intensiva E-9!!!

Dominação global, genocídios localizados, dicas de vestuário assustador, 15 frases que todo vilão deve saber, como gargalhar diabolicamente, assessoria em planos mirabolantes, como decorar uma ilha secreta, onde arranjar os melhores capangas, onde arranjar os melhores puxa-sacos, tudo isto e muito mais você vai ver no novíssimo curso de vilania intensiva E-9!!! Aulas especializadas com gente que entende do assunto!!!

Quanto custa um curso destes? Quase nada! Confiando plenamente em nossas capacidades (como todo bom vilão que se preze) você só paga o curso após conseguir dominar o mundo. Pode nos dar algum país que não vá usar. A Bulgária, por exemplo. Quem liga pra Bulgária? Acho que nem os búlgaros ligam pra Bulgária! Você nem vai sentir falta...
Ou ainda pode pagar o curso através do dízimo. Após chegar ao poder, lhe damos uma lista de pessoas que não gostamos e você dizima elas!
Viu? É fácil e prático!

Você pode também fazer uma aula-teste conosco, se em um fim-de-semana não conseguir dominar Camaquã pode se considerar liberado do curso porque você realmente não leva jeito pra coisa.
E você ainda recebe no curso nosso MANUAL DO VILÃO INICIANTE com 666 dicas de comportamento ar-re-pi-an-tes.

Aqui alguns trechos do manual:

"DICA 245- REVELANDO PLANO PRO HERÓI
Todo vilão sempre passa por este momento, ali está o herói, amarrado, indefeso, e você deve estar sentindo aquela vontade incontrolável de passar os próximos 30 minutos explicando para ele seu plano em detalhes, como impedir o plano, o porque deste plano, sua motivação etc, etc, etc, caro amigo, nunca, mas NUNCA faça isso! Dá azar! Ouça minhas palavras: todo vilão que faz isso, mas TODO mesmo, sempre se estrepa.

COMO PROCEDER:
Antes de mais nada, o herói capturado, pegue a primeira arma que estiver ao seu alcance, e descarregue todo pente nele, assim, no ato. Após isto, para garantir, pegue a segunda arma que estiver ao seu alcance e descarreeeeeeeegue de novo.
Feito isso, chame três legistas para confirmar se o herói está mesmo mortinho da silva.
Se a resposta for positiva, só então conte todo seu plano em detalhes para ele e não se esqueça de gargalhar feito um louco no final"

"DICA 376- ESCOLHENDO O BANDO
Conforme você já deve ter reparado, todo vilão aparentemente sempre retira seu exército particular dos figurantes dos Trapalhões.
Pode ver, exército de vilão só serve para tomar porrada do herói, nada mais, não importa que este mesmo exército esteja armado até os dentes e o herói esteja armado apenas com uma escova e a óbvia superioridade numérica. Estas coisas são meros detalhes para um herói e roteiristas preguiçosos.
Contrate pivetes do Rio para seu exército particular. Aí sim! Além de serem muito mais baratos e melhores de briga, não dou dez segundos para o herói ser depenado até os ossos por eles."

" DICA 598- OS NUNCAS
NUNCA, repito, NUNCA:
a) Sequestre a filha, ou mate a esposa, o mestre, o melhor amigo, o ex-parceiro, mentor, animal de estimação, porteiro do prédio, enfim, o que for, do herói! Nunca! Entendeu? Estes caras são vingativos pacas! Para que cutucar a onça com vara curta? Sinceramente, no seu lugar eu evitaria até andar na mesma calçada que algum conhecido do herói. É um tanto covarde, admito, mas é melhor prevenir do que remediar.
b) Queira matar o presidente dos Estados Unidos da América. Dá azar. Tente matar o presidente do Sudão ou o presidente da Unidos da Sapucaí, é mais seguro.
c) Aceite ser vilão em um filme que tenha o Charles Bronson, o Arnold Schwazzenegger ,o Jean Claude Van Damme ou congêneres no elenco. É praticamente suicídio assistido. Sempre confira o elenco antes."

Interessados? Liguem para 555-666 ou mandem um e-mail para maufeitoumpicapau@666.com.br e não percam esta oportunidade!

Fábio Ochôa
Mau feito um pica-pau comendo mingau com colher de pau.

sábado, junho 17, 2006

Olho de Lobo



Existem “armadilhas” inevitáveis de se cair quando se cria alguma coisa. Para mim, é inevitável que meus poucos personagens tenham um pouco de mim mesmo em suas essências. Este é o caso de Canino, um lobo que venho polindo desde 1994 quando o rabisquei pela primeira vez no papel.

Não posso dizer que seja fácil ou difícil, apenas foi assim. Este personagem não surgiu sem propósitos em minha cabeça. Hoje percebo que, de certa forma, ele serviu como um filtro de personalidade. Nele depositei muita coisa que passei por vida. Com ele guardei meu passado e meu presente, assim como meu desejo de futuro, meus ideais e meus princípios.

Deixando clara a importância deste ser para mim, sinto-me livre para falar então do olho. Aprendi a desenhar com meu pai em muitos sentidos. No inicio, quando ele era vivo e eu tentava acompanhá-lo durante seu projetos, era meu ídolo. E depois que o perdi, além das lembranças, tive seus quadros desenhados a grafite integral em papel casca de ovo. Sua precisão e detalhes são impressionantes – não é por ser meu pai – diga-se de passagem. Ele teve um carinho todo especial pelo rosto, pela expressão facial, pelo OLHO. Desta forma o desenho do olho se tornou um vicio instintivo no meu traço. É um olho que eu rabisco num papel qualquer quando estou ao telefone, é um olho que minha mão faz automaticamente no canto de um caderno enquanto presto atenção em outra coisa. O olho, com seu significado mágico de Ver, de mostrar, de tornar claro, sempre me fascinará. E herdando este vicio plástico de meu progenitor não poderia deixar de valorizar tal parte em meus personagens, híbridos de meus devires com minha criatividade.


Olho de Lobo
Olho de força
Quem és tu que procura o que não sabes?
Quem és tu que não encontra o que conheces?

Força Lobo, segue em frente
Vai buscar teu nascer de sol
Não deixa que teu poder te torne cego
Tão somente que tuas fraquezas te tornem descrente

Uma jangada ao mar te levará longe
Uma vontade no peito te levará aonde tu quiser
Olho de esperança
Olho de Lobo

Segue em frente
Até onde a vista der


Uma viagem de
Eduardo Bonini Hoewell

sexta-feira, junho 16, 2006

Van Helsing


Aqui algumas cenas de estudo de Van Helsing, um dos meus projetos de estimação.

A idéia tem uma origem bem curiosa, ocorreu depois do malfadado filme estrelado por Hugh Jackman. De tão ruim, durante a projeção comecei a me distrair reinventando a história e o personagem, estudando possibilidades.

A história se passa no século retrasado. O fim de uma era, onde o último e adoentado caçador de monstros caça os últimos monstros.
É uma história crepuscular, sombria e um tanto melancólica, situada no começo da era industrial onde a urbanização começou a tomar força, o século XX a se gerir como o conhecemos, uma época onde mitos e superstições começavam a definhar e morrer ante a era da razão (relativamente falando, claro), onde dogmas seculares eram derrubados, e os primórdios da psicanálise eram esboçados revelando que pela primeira vez o homem não era responsável por todos os seus atos.
Uma época de antigos monstros mortos, sendo gradualmente substituídos por outros, tão assustadores quanto: nós mesmos.

O Van Helsing da história é construído diretamente em cima de Peter Cushing (levante a mão quem conhece, isso, o Van Helsing dos filmes da década de 50/60 da Hammer, em algum lugar da história arranjo espaço para encaixar o Christopher Lee).

Para nós, o máximo seria publicar pela Dark Horse (tenho uma espécie de idéia fixa de publicar alguma coisa pela Dark Horse, mas também, eles são a casa do Hellboy e do Concreto, caramba) se conseguisse, poderia morrer no dia seguinte, que estaria plenamente feliz.

O primeiro desenho é de autoria minha e de Augusto, o segundo, do Augusto. Ambas as cores são minhas.

Ah, e o roteiro também é meu.

Fábio Ochôa

quinta-feira, junho 15, 2006

Dez Anos Sem Calvin & Haroldo...


Me lembro bem no segundo grau, no intervalo das aulas eu lendo uma matéria em uma Wizard comprada na véspera sobre a desistência de Bill Watterson em produzir a tira Calvin & Haroldo.

Ele havia tomado a (sábia) decisão de abandonar a tira enquanto ele se encontrava em seu auge criativo, de forma a não sabotar o próprio trabalho, trocando em miúdos, "sair enquanto estava por cima".
No topo do meu cinismo, imediatamente imaginei que ele voltaria dentro de um ou dois anos, à medida que as ofertas de retornos fossem ficando mais polpudas.
Pois bem, já faz 10 anos que isso ocorreu. Watterson nunca voltou atrás em sua decisão e não dá indícios que irá voltar.
Aliás, Watterson aparentemente foi sugado por algum buraco negro neste período de tempo, ou foi caçar andorinhas nas matas de Bornéu, pois nunca vi mais nenhuma nota com qualquer notícia sobre o autor.

E nestes dez anos a saudades aumentou.
Nenhuma tira ou personagem chegou nem perto de suprir a falta que estes personagens fazem, seja em qualidade, seja em carisma.
Ô droga.

Calvin & Haroldo, junto com Love & Rockets e V de Vingança, talvez seja minha trinca de quadrinhos favoritos (embora sinta que devia colocar Mafalda e Blueberry neste rol, este é meu problema com listas, elas sempre tendem a crescer) e Bill Watterson sempre foi para mim uma grande influência, oferecendo não apenas uma piada rápida no espaço limitado de 3, 4 quadros, mas sim uma boa dose de observação humana, humor ferino e ternura neste espaço tão limitado dos jornais.

É um dos artistas que mais tentaram expandir as dimensões humanas deste mundinho tão pequeno e asséptico das tiras, talvez eu colocaria George Herriman e seu Krazy Cat, junto com ele, Walt Kelly e seu Pogo, Charles Schultz e Snoopy e obviamente Laerte Coutinho e Quino e sua Mafalda.
E olha que acho que a lista acaba por aqui mesmo...6 nomes em uma indústria com mais de 100 anos...para ver o tamanho do buraco...
E sem a engraçada amizade de um garoto e seu tigre de pelúcia imaginário, o mundo dos quadrinhos fica um pouco mais frio. A mesa posta fica sempre com a sensação de uma cadeira vazia no ambiente.

Watterson se aposentou, Quino não faz mais Mafalda, Schultz está morto e Bush está no poder. Cacete! Que craca de mundo é esse?

Fábio Ochôa

terça-feira, junho 13, 2006

Felicidade Copística

Lembro bem de assistir com meu pai o desesperador jogo em que o Maradona vence o Brasil com um gol de mão, era a semifinal da copa de 1990. A vibração, a esperança, a derrota, a raiva, e por fim simplesmente a tristeza.

Quatro anos depois. Desta vez na fazenda do meu avô. Brasil contra Itália. Jogo maçante, o desgaste era visível no rosto dos jogadores de ambos os times. A força, a garra, guerreiros batalhando durante o espaço de tempo máximo possível em jogos de futebol. A tensão me dava dor de cabeça à medida que cada prorrogação terminava. Por fim, sob jogadores abraçados em concentração como pano de fundo, uma disputa lotérica de Pênaltis. O chute final de um Italiano desafortunado. Nossa vitória trancada há muito tempo é liberada na atmosfera em forma de gritos. Estávamos tão cansados quanto nossos jogadores, mas estávamos muito, mas muito felizes. Lembro bem que depois de toda a agitação da vitória, por não estar na cidade, o silencio logo tornou a cantar, e eu contemplando aquelas saudosas paisagens dos pampas percebi aquelas terras brasileiras, GAÚCHAS muito mais bonitas do que outrora.

Não lembro muito do que senti na Copa de 1998, exceto por desilusão. Nem mesmo a raiva esteve presente. O Brasil não jogou aquela copa, pelo menos não a partida final dela.

Sobre 2002 também tenho pouco a falar. Nova vitória, mas parece que as coisas estavam fáceis demais. Não teve emoção que perdurasse como as que já lhes citei. Interessante pensar que as coisas nos parecem mais ricas e cheias de encanto quando somos crianças. Com certeza fiquei feliz, sem dúvida alguma, pela nossa conquista.

Hoje, dia 13 de junho de 2006, faltam 30 minutos para a estréia de nosso time na Copa. Algo grita dentro de meu peito. Acho que retomei aos meus 8 anos onde pouco me interessava o que significava realmente o futebol. Sou forçado a confessar que faço parte daqueles brasileiros que são fanáticos por este esporte, pelo menos de coração, pelo menos na Copa do Mundo. Hoje, com minha consciência critica mais madura, posso dizer que não só a felicidade e o desejo de vitória ocupam meu peito. Desejo que nossos representantes mostrem ao mundo o valor dos povos desta nação. Desejo união entre ela, mesmo aos gaúchos mais radicais – deixem seus ressentimentos de lado. Ontem fomos guerreiros destas fronteiras, não recebemos reconhecimento daqueles que eram nossos superiores, mas não precisamos disso, somos maiores. Novamente Hoje, nos tornamos guerreiros das fronteiras do sucesso, as esperanças e anseios caem em grande peso nos ombros de um dos nossos. Força Brasil.

Para finalizar esta conversa aparentemente sem sentido, não vejo a Copa como o novo Pão e Circo, as vésperas das eleições. Desejo sim que aqueles homens que nos representam em terras distantes façam o melhor de si. E sonhadoramente desejo que suas façanhas sirvam de exemplo a toda esta Terra. Que nossos representantes sintam-se um pouco incomodados e envergonhados, que queiram jogar em equipe. E que nosso sofrido povo tome o exemplo para suas vidas, batalhem por cada Passe, por cada Gol. Deixaríamos com certeza o Brasil não só o país do Futebol, mas também da Dignidade.

Como fico feliz com a copa...
Eduardo Bonini Hoewell

sexta-feira, junho 09, 2006

Samantha

Aqui um desenho de Samantha, a jovem bruxa pelotense (e convenhamos, se tem cidade que poderia sediar um evento de bruxas, demônios e criaturas gótico-macabras afins, É Pelotas) criada por Augusto, o porteiro do Orkut, o padeiro do estúdio, etc, etc, etc...

Só pra avisar, o desenho é dele, as cores são minhas.

Já escrevi algumas linhas (tá bom, muitas linhas) dando vida à personagem. Para ser franco, gosto muito dela, e ela é construída à partir de muitos pedaços de mulheres que conheci.
Taí. Entreguei o ouro.

Curiosamente, apesar de Samantha ter sido proposta e nascido para os quadrinhos, ela fez a estréia em duas mídias bem diferentes, num roteiro de curta-metragem ("O Coração de Zé Darci", roteiro meu e um dos meus trabalhos favoritos), onde ela acaba em determinado ponto da história cruzando com Domênico, outro gigantesco conhecido nosso, e em um conto literário para uma coletânea ("Algo Chorando Embaixo da Cama") onde ela contracena comigo mesmo. Egolatria pouca é bobagem.

Quanto aos quadrinhos? Para quem já apareceu em roteiros de cinema e na literatura, quem sabe no futuro?

Fábio Ochôa

Blue Moon of Kentucky

Sabe, desocupado ou entediado amigo, existe um prazer genuíno e raro em descobrir coisas novas (mesmo que elas não sejam lá tão novas assim) por conta própria.

Sei lá, nos dá aquela sensação boa de por alguns momentos somos os únicos conhecedores de uma boa obra, seja ela música, filme, o que for. Naquele momento que a descobrimos ela é só nossa, feita para nós, está longe do domínio público onde todos a comentam.
É um tipo de prazer estranho e secreto, aquela coisa de "apenas nós a conhecemos e podemos comentá-la", vai me dizer que você nunca sentiu isso? Seja franco.

Um dos meus grandes baratos no mundo das artes sempre foi isto, descobrir ou redescobrir aquelas coisas de que ninguém mais fala há respeito.

Com o tempo comecei a criar uma birra até um tanto pedante contra os gostos massificados, contra aquele
filme/livro/banda que todo mundo comenta e ama ou odeia, não sei, a massificação tira um pouco do sabor da genuína descoberta, antes de ler, ouvir, assistir qualquer coisa já temos uma bagagem imensa de "pré-opiniões" a respeito delas, só nos restando concordam com um ou com outro.

A massificação (até por isso o nome) nos dá opções de opiniões prontas. Não nos ensina a julgar e pensar por nós mesmos (nossa, agora eu descobri a roda!).
E às vezes nem mais sabemos se o nosso gosto é realmente nosso mesmo.
Tá bom, eu tô virando aquele tio velho.

Há alguns anos eu era um aficionado por informação. Hoje, de maneira curiosa, cultuo um certo grau de alienação, vejo filmes, leio quadrinhos e escuto música com meses ou até anos de atraso. Quando ninguém mais fala deles.
É aqueles benditos hábitos curiosos que todo mundo acaba adquirindo com o tempo.

É uma maneira boa de manter o espírito da descoberta. Uma das coisas que mais tem rodado na minha jukebox atualmente é Elvis "the pelvis" Presley, coisas como Blue Moon of Kentucky e coisas do gênero, redescobertas jurássicas nas minhas escavações ao passado.
Porque? Porque eu gosto.
Simplesmente por isso.
E pode me chamar de tio velho e ranzinza que eu até gosto.


Blue Moon Of Kentucky

Blue moon, blue moon, blue moon,
keep shining bright.
Blue moon, keep on shining bright,
You're gonna bring me back my baby tonight,
Blue moon, keep shining bright.

I said blue moon of Kentucky
keep on shining,
Shine on the one that's gone and left me blue.
I said blue moon of Kentucky
keep on shining,
Shine on the one that's gone and left me blue.

Well, it was on one moonlight night,
Stars shining bright,
Wish blown high
Love said good-bye.

Blue moon of Kentucky
Keep on shining.
Shine on the one that's gone and left me blue.

Well, I said blue moon of Kentucky
Just keep on shining.
Shine on the one that's gone and left me blue.
I said blue moon of Kentucky
keep on shining.
Shine on the one that's gone and left me blue.

Well, it was on one moonlight night,
shining bright,
Wish blown high
Love said good-bye.

Blue moon of Kentucky
Keep on shining.
Shine on the one that's gone and left me blue.

Fábio Ochôa

segunda-feira, junho 05, 2006

O Porteiro do Orkut

A vida reserva surpresas.

Quem poderia imaginar que o Augusto, nosso amigo e colega de trabalho do estúdio na verdade é uma celebridade internética (acho que acabei de inventar esta palavra), tendo seu rosto visto por milhões de pessoas diariamente, coisa que, acredito, nem a Tiazinha conseguiu (se bem que o que ela mostrava ficava em outra extremidade mesmo).

Você já viu o rosto do Augusto. Sua namorada também. Seus amigos também. Se bobear até sua avó já viu o rosto dele na tela do monitor. Duvida? Vá para o site do Orkut e olhe aqueles rostos na entrada, onde pedem a senha.
Viu? Agora naquela fileira de rostos, olhe a oitava foto, o sujeito narigudo e com sorriso de quem acabou de soltar um traque barulhento. Olhou? Pois é! É o Augusto! Se duvida compare com a foto acima, péssima, mas foi a única que conseguimos roub...digo, arranjar! Augusto, nosso amigo, colega de trabalho e, conforme descobrimos agora, porteiro do Orkut!

Conheci Augusto há já alguns anos, aliás, bem antes do Orkut o escalar para porteiro, em um curso de quadrinhos promovido pelo Law Tissot (eu não fazia o curso, mas acabei indo lá jogar conversa fora com o pessoal em algumas ocasiões. Longa história.).
Pude ver a evolução dele em termos de traços durante estes anos, um traço bem marcante e estranho, ao mesmo tempo melancólico e com uma cruza harmônica de Tim Burton, Miguelanxo Prado e Chris Bachalo somado aos gêmeos Moon e Bá.
Um bom caminho, sem dúvida.
E neste processo de evolução ele também veio a se tornar para mim uma coisa bem mais preciosa que um bom desenhista.
Veio a se tornar um dos meus melhores amigos.
E olha que é preciso muito para mim falar uma coisa destas.

Engraçado, histriônico e criativo. Sempre disposto a ajudar e às vezes autêntico de maneira quase ingênua.
É uma grande pessoa, até porque mede 1,80 e pesa mais de 100 quilos, o que, convenhamos, ajuda muito, e com uma grandeza emocional pura que não encontra par na sua estatura.
Aquela coisa que não aprendemos a ter, simplesmente nascemos com ela.
E ele também acha que tem um rosto parecido com o de Neil Gaiman, teria, se Gaiman fosse fazer uma plástica com cinco cirurgiões bêbados.

No entanto, mais do que o amigo, o artista ou até mesmo o porteiro do Orkut, o que ficará em nossas lembranças no dia em que partimos será os pães que ele prepara para estes mentecaptos do estúdio. Para nós, não importa se visto por milhões de pessoas diariamente ou apenas uma, ele sempre será isto: O homem que com suas mãos sova o pão que comemos em nossas reuniões, Augusto- o padeiro do estúdio 9.

Fábio Ochôa

There's no other way...

Tem bandas que são um caso estranho, estão aí à anos mas ninguém admite ser fã delas.
Pense bem: Quantas vezes você já ouviu alguém falar que é fã do Blur? Nenhuma? Nem eu.
Tá. Mas eu sou fã do Blur.
Taí. Pronto. Disse.

Gostos são coisas engraçadas, me lembro de um conhecido que achava Ozzy Osbourne o maior cantor do mundo, o Kiss, os segundos (éramos adolescentes, isso justifica tudo) e o terceiro lugar era ocupado por... Paulo Ricardo e seu RPM.

Outro, um amigo meu, com um gosto fixado no underground e toda sorte de música porrada, certa vez, após umas cervejas a mais, nos informou, introspectivo, ser muito fã do Benito de Paula (óbvio que ficamos em silêncio, não há o que dizer em momentos como estes).

Pessoalmente gostaria de ter postado aqui a letra de Tender ou The Universal, do Blur, são duas músicas que ouço até gastar os ouvidos, como não encontrei, fiquem com There’s No Other Way, não é um marco da música, nem tampouco genial, mas apenas uma canção doce e bacana como boa parte da produção destes ingleses.

There’s No Other Way (Blur)

You're taking the fun
out of everything
making me run
when I don't want to think
you're taking the fun
out of everything
I don't want to think at all

there's no other way
there's no other way
all that you can do
is watch them play

you're taking the fun
out of everything
you're making it clear
when I don't want to think
you're taking me up when
I dont want to go up anymore
I'm just watching it all

there's no other way
there's no other way
all that you can do
is watch them play

I'll watch you play

Fábio Ochôa

domingo, junho 04, 2006

Enquanto isso, do lado de cá do computador...


Esta era a ilustração em que eu estava trabalhando agora à pouco e é parte de um infográfico que atravessará algumas páginas (uma ou duas) da revista Biopop, falando sobre a evolução dos costumes comerciais e sua relação com agricultura ao longo dos séculos.

Cada dupla de personagens negociando, uma faixa de tempo, aqui estamos nos idos de 1600, é um tanto complexo de fazer, mas sempre muito divertido.

Para quem não conhece, em suma, este é meu trabalho. Sou ilustrador.
E sempre acho curioso como muitas pessoas que me conhecem informalmente sempre se surpreendem com isto, (geralmente os amigos dos meus amigos, que também acabam se tornando meus amigos com o tempo) não associam desenhar nem à minha personalidade, nem ao meu sustento, quando isto foi uma das coisas que sempre fiz na vida.

É um bom emprego. Imagino que ajude a manter minha mente no lugar e os olhos e interesses sempre voltados para tudo.
Impede a alma de enferrujar, também.
Dentro de certos limites é uma das coisas que me faz feliz, e isto é mais do que muita gente pode dizer.

Assim, a quem compra as coisas que faço, mesmo sem saber, obrigado pela atenção.

Fábio Ochôa

sábado, junho 03, 2006

O Dia que Ela Morreu


Eu tinha 7 anos de idade quando fui apresentado ao conceito de morte.

Não vou ser cínico, na minha vida, sempre pude ser considerado um sujeito de sorte em muitos aspectos, nunca perdi ninguém muito próximo a mim.
Portanto, posso imaginar e entender em nível racional o que é a perda, mas se eu dissesse que sei o que é isto, estaria mentindo.

Eu era uma criança um tanto estranha, reconheço hoje. Que pensava demais em coisas que as crianças usualmente não pensam... o que existe depois da morte? E se houvesse a guerra nuclear e nada mais restasse, qual o sentido de tudo isto? Existem extraterrestres? Eles tem alma?
Não era pra menos que uma criança assim só pudesse virar um contador de histórias quando adulto.
Quanto mais eu crescia, mais as dúvidas perdiam a importância. Valiam na hora de contar histórias, mas não ocupavam espaço na vida pessoal. Perdi o interesse como pessoa, pelo que existe do "outro lado", bem, todos caminhamos para lá, então, cedo ou tarde irei acabar descobrindo mesmo...
Seguindo esta lógica tratei de me ocupar de viver.
Crescer é virar pragmático.

Mas voltando ao meu primeiro encontro com a morte.

Eu tinha 7 anos de idade quando caiu nas minhas mãos Superpowers 05, com a morte da Supermoça. Havia já algum tempo que eu era um leitor voraz de heróis, mas esta edição foi especial.
Nela, Supermoça (personagem até então, tão importante e relevante para mim quanto o pneu traseiro do Batmóvel) após várias páginas de combate heróico e num gesto de auto-sacrifício encontrava a morte nas mãos do Anti-Monitor (eu sei, o nome do vilão é patético, esta saga, Crise nas Infinitas Terras, é uma longa história que todo nerd conhece, e todo não-nerd não deve estar nem aí pra ela, portanto lhes pouparei de contá-la), bom, o fato é... ela morria.

Obviamente, como toda criança, já possuía alguma noção vaga do que era a morte –assim como o sexo, era o assunto proibido dos adultos- mas neste gibi, pela primeira vez eu era apresentado à noção humana de morte para os que aqui ficam, o vazio irreparável que ela deixa, a perda brutal e inesperada, o imutável.
A mensagem das páginas finais era bem clara: Supermoça havia se ido, alguém querido e amado por alguém e poder nenhum poderia traze-la de volta.
Havia acabado. E para os que ficavam só restava arcar com o peso da despedida, o peso do nunca mais.
Claro que não havia racionalizado tudo desta maneira na época. Mas havia compreendido tudo isto em um nível emocional, subliminar.

Dali ficou uma imagem que sempre me vem à mente, pra mim quase um símbolo do significado humano da morte: O grito mudo de Superman enquanto segura o corpo da prima em seus braços, acho que imagem algumanos quadrinhos traduziu tão bem o desespero da perda, a impotência, a incapacidade de mudar o destino, o dolorido foi, existiu, nunca mais teremos de volta.
Qualquer palavra ou balão arruinaria completamente a cena. É a imagem que fala por mil palavras.

Depois disto, houve dezenas, centenas de filmes, jogos e quadrinhos que banalizavam a morte, à reduzindo à um mero ritual mecânico nas tramas, mas com este gibi, nos recessos da minha aprendia uma coisa muito importante: Toda morte é sentida por alguém, toda vida, em algum momento, é importante para alguém.

E ao pensar nisto tudo, uma frase anônima que li certa vez me vem à memória: A arte serve como batedora para a vida, nos concedendo experiências antes que elas cheguem até nós.

Fábio Ochôa

Guia para Fugir do Marasmo 03


Terceira Parada- Cantiga de Ninar- Chuck Palahniuk

Chuck Palahniuk não escreve livros, escreve tijoladas nos testículos dos leitores (metáfora sutil, elegante e refinada by Ochôa, obrigado).
Palahniuk consegue algo único hoje em dia, seus livros despertam reações, incomodam, faz você sentir.
Incomoda. Esta é talvez, junto com genialidade, a palavra-chave.

Seus textos sempre partem de propostas delirantes, expondo através de uma sensação incômoda e brutal que permeia todas as páginas, a esterilidade de nossa cultura e a desumanização promovida pela nossa sociedade.
Francamente? Uma tijolada no saco (metáfora, sutil, elegante e refinada by Ochôa, obrigado).

Cantiga de Ninar, é a história de uma cantiga de ninar que mata crianças. Falando apenas isto, pode até não parecer grande coisa, mas o livro é bem mais que isto.
Junte a este ponto de partida repórteres assassinos em massa, corretoras de imóveis mal-assombrados, jovens bruxas wicca, o impagável terrorista cultural Ostra, estupradores de cadáveres, e vai ter uma boa idéia do que o livro é.

Através dos tipos mais insólitos e com sua narrativa única, incômoda e brutal, Palahniuk expõe nossas vísceras, nosso sistema distorcido de existência. Acredite, não é fácil e requer estômago.
É impossível ficar indiferente aos livros dele. Mais do que recomendadíssimo.
Vale a pena lembrar, é o mesmo autor do livro que deu origem ao filme Clube da Luta, o que por si só já diz muita coisa.

Trecho antológico:
"As luvas de brancas de Helen estão enegrecidas de poeira.
Ela diz que rasgou a página da cantiga de poda e jogou-a pela janela do quarto da criança. Está chovendo. O papel vai apodrecer.
Digo que isto não basta. Algum garoto pode achar a folha. O simples fato de a página ter sido rasgada já fará alguém querer juntar os pedaços. Algum detetive investigando a morte de uma criança, talvez.
E Helen comenta: - O banheiro parecia um pesadelo.
Damos a volta ao quarteirão e estacionamos. Mona está rabiscando no banco traseiro. Ostra está ao telefone.
Helen aguarda enquanto me abaixo e volto à casa. Vou me esgueirando pelos cantos, com o gramado molhado prendendo meus sapatos, até chegar embaixo da janela que Helen diz ser a do quarto das crianças. A janela ainda está aberta, com um pedaço das cortinas caída para fora sobre o peitoril. Cortinas cor-de-rosa.
Os pedacinhos rasgados da página estão espalhados pela lama e começo a apanhá-los.
Por trás das cortinas, no quarto vazio, ouço uma porta se abrir. Um vulto se aproxima, vindo do corredor, e me agacho na lama sob a janela. A mão do homem pousa no peitoril, de modo que me achato de encontro à casa.
Num ponto acima de mim que não consigo enxergar, um homem começa a chorar.
Começa a chover mais forte.
O homem fica parado junto à janela, inclinado com ambas as mãos sobre o peitoril. Soluça com mais força. Dá até para sentir o bafo de cerveja.
Não posso correr. Não posso me levantar. Com as mãos tapando o nariz e a boca, vou me esgueirando lentamente, bem junto aos alicerces da casa. E com a rapidez de um calafrio, respirando por entre os dedos, também começo a chorar. Com soluços que mais parecem de vômito. Sinto câimbras na barriga. Com os dentes mordendo as palmas, sinto o catarro respingar nas minhas mãos.
O homem dá uma fungada forte e borbulhante. Está chovendo mais e a água encharca meus sapatos por entre os cordões.
Com os pedaços rasgados do poema nas mãos, detenho o poder da vida e morte. Mas não posso fazer coisa alguma. Ainda não.
E talvez a gente não vá para o inferno pelas coisas que faz. Talvez a gente vá para o inferno pelas coisas que não faz.
Com os sapatos cheios de água fria, meu pé pára de doer. Com a mão escorregadia de catarro e lágrimas, desligo meu bipe.
Quando encontrarmos o grimoire, se houver um meio de ressuscitar os mortos, talvez nem queimemos a coisa.
Pelo menos começo."

Fábio Ochôa